27.2.15

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Todos temos, mais cedo ou mais tarde, de enveredar pelo mundo do trabalho. Todos temos, mais cedo ou mais tarde, a noção do que queremos exercer como ocupação de vida. Nem sempre de um modo confiante na escolha. Às vezes, somos empurrados para uma ocupação por interesses alheios, por falta de oportunidades, pelas circunstâncias. Seja cantar, seja entreter público, seja a gerir, seja a tratar ou cuidar, enfim, seja a fazer uma das milhentas atividades de que o mundo carece.

Num mercado de trabalho sem imaginação nenhuma, muito aquém das oportunidades para as mais variadas áreas necessárias a uma sociedade equilibrada, realizar-se numa profissão é algo raro, digamos. Trabalhamos, sim. Mas, não significa que sejamos o melhor que podíamos ser. Até porque as nossas melhores capacidades ou competências não são exigidas ou necessárias, para aquele tipo de trabalho em que estamos inseridos, e apenas realizamos o trabalho no melhor que conseguimos. Claro está, não na melhor performance exigida (não posso ser o melhor jogador do mundo se não tenho a melhor coordenação motora, mas posso jogar). Não acredito é que vá desenvolver a maior motivação para a melhor performance, até porque não acredito que as minhas melhores competências estejam a ser usadas e rentabilizadas. Posso, contudo, trabalhar. Aprender, caso não tenha nenhum défice acentuado. E posso, também, ter o maior profissionalismo no que faço. Porém, isso tem já mais a ver com a minha formação de base do que com a técnica da atividade.

Para quem não está no mesmo local de trabalho, nem executa a mesma profissão, desde sempre e para sempre, sabe que profissionalismo nada tem a ver com técnica. Sabe que, num primeiro momento, um determinado trabalho parece uma coisa do outro mundo e transforma-se em algo banal passado pouco tempo. Sabe que para aprender basta querer e dedicar-se. E para fazer, basta empenho e vontade de executar corretamente aquilo para que se é pago. Às vezes, até se faz muito mais para o que se é pago e pelo quanto se é pago. No entanto, quem passa por diferentes profissões, ou melhor, trabalhos, também sabe que há muitos aspetos que contribuem para uma insatisfação laboral. E um dos principais, para além de não se identificar com a causa da empresa ou instituição, é a política de liderança da empresa. Acho que muitos de nós andamos a ocupar-nos com algo que não rentabiliza as nossas potencialidades. E muitos realizam ocupações que não espelham minimamente as suas competências. Quando chefes, pensam ter capacidade de liderança, mas não há nada nas suas ações que o demonstre, é fácil perceber como é que uma equipa de trabalho não consegue estar motivada a desempenhar funções. Sim, porque é engraçado observar, por vezes, como pequenas alterações nos cargos de chefia podem fazer milagres na produtividade das pessoas, de uma empresa. Como, por vezes, alterações em elementos de uma equipa podem ter o mesmo resultado. Basicamente, retirar de uma organização pessoas que não têm as competências para o cargo. E nem se interessam em ter. Para não falar que esse “nem se interessam em ter”, já por isso só indica algo tão básico como falta de profissionalismo. Isto porque profissionais e profissionalismo nem sempre andam de mãos dadas.

Acredito mesmo que há espaço para todas as profissões do mundo, como há espaço para o desenvolvimento da nossa vocação. Se nos conhecermos, sabemos perfeitamente o que nos dá gosto fazer e o que não dá. O que temos facilidade em executar. Aquilo com que realmente nos identificamos. Continuo a acreditar que devemos fazer o que estamos vocacionados para fazer. Uns podem chamar a isso a missão da sua vida, outros a paixão, outros a causa. Fazer o que nos faz sentido, nem sempre significa exercer um rótulo, chamado profissão de x ou y. Significa antes, que desenvolvemos competências em determinada área, para a qual nos formamos ou aprendemos das mais diversas maneiras. Mas mais do que essa formação, fazer algo para o qual temos talento. E o talento não se treina. Vai-se adquirindo ao longo da vida pelas mais variadas experiências. Chamemos-lhe aptidão. Uma facilidade natural para fazer determinada tarefa. 

Se o que fazemos como profissão fosse sinónimo da nossa marca, aposto que muitos de nós não se reconheceria no espelho, mesmo que lá estivesse escrito o nosso nome. Por isso somos muito mais do que fazemos num local de trabalho. Eu exerço esta profissão. Não sou esta profissão. Até porque se mudar de emprego não deixo de ser eu. Mas um facto é que a profissão nos retira muito tempo diário. Até ao ponto de nos confundirmos com esta.

Nunca me imaginei a trabalhar no mesmo sítio por 40 anos. Só de imaginar sinto-me sufocada. Mas isso sou eu. Porque me conheço. Haverá muita gente a não se imaginar a mudar de profissão ou de local de trabalho. Mas, tal como me alicia ter novos projetos, também me alicia fazer algo que me motive, que me faça sentido. É-me difícil imaginar o porquê de tantas pessoas presas a empresas ou atividades, completamente desmotivadas, e nem sequer ponderarem uma mudança. Porque às vezes essas pessoas nem razões ligadas “à corda ao pescoço” têm. O que torna essa condição ainda mais confusa. É mais um medo que ata mãos e, consequentemente, vocações. E, consequentemente, sonhos. E, consequentemente, equilíbrio emocional. Nem sequer pensar em mudança já é, para mim, um aniquilar do próprio reconhecimento das nossas capacidades e potencialidades. Um aniquilar do nosso próprio sentido. Um limitar-nos. Porque é óbvio que se tem de começar por algum lado. Também precisamos de dinheiro para gerirmos o nosso quotidiano. Para ganhar dinheiro temos várias hipóteses de trabalho. Claro, com variações nos montantes finais. Mas querer continuar num certo trabalho implica, no mínimo, envolvimento. E isso não é nada estimulado hoje em dia. Não admira pois que muitos entrem em combustão cerebral, seja pelo esgotmento, seja pela desmotivação, seja por desencantamento. E como nem todos podem mandar um trabalho/emprego à fava, e outros tantos nem se atrevem a fazê-lo por medo do que há de vir, pactua-se com um mundo em que andam todos ao contrário, ou deslocados dos próprios talentos. A dedicar a maior parte do tempo de vida a locais e profissões que têm tudo a ver com tudo, menos consigo próprios. E ocupados a desenvolver o mediano que há em si.

 

Cecília Pinto

 

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25.2.15

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MÃE, a palavra mais terna que envolve este nosso Universo...

Quem tem esta bênção de Deus pode dar início a vislumbrar o seu Amor, incondicionalmente servir seres extremamente dependentes sem esperar nada em troca... A entrega física, emocional e mental que o papel de mãe exige, só elas, aquelas que verdadeiramente assumem a sua profissão, podem relatar, a mais perfeita experiência que o ser humano pode abraçar.

A mais bela e exigente profissão ensina-nos a amar na totalidade e dá-nos a oportunidade de esculpir o nosso ego à luz da perfeição que se pretende que seja o objetivo da escola humana.

Para que este papel seja perfeito o ego terá que entregar a vida em prol da criação de seres com consciência, é de extrema urgência que todas as mães percebam que deram a oportunidade a outras almas de virem continuar o seu processo de aprendizagem, que têm a responsabilidade de as orientar no caminho de Deus, ajudando os seus filhos a crescerem com base nos seus ensinamentos; como sabemos eles não são nossos, mas sim obra da majestosa criação deste Universo e é à Luz de quem permitiu a sua existência no físico que devemos formá-los. Esta tarefa, se for efetuada segundo estes princípios, exige a entrega de uma carreira profissional nos moldes desta sociedade, exige a falta de noites de repouso, exige a desvalorização da nossa doença física, exige o controlo dos nossos estados emocionais, exige a total e sincera entrega, em liberdade, em paz e em total Amor.

A falta de compreensão por muitos daqueles que não valorizam a mais nobre e responsável profissão, torna o papel daquelas mulheres que pretendem dar a vida em prol da criação, um verdadeiro inferno.

É com estas palavras que vivo na esperança que todos assumam um especial respeito por todas as mães. Estas tiveram a coragem de passar pela mais enigmática experiência - emprestaram o seu corpo para que um novo ser se formasse no seu interior... Só estas mulheres podem relatar esta, sem palavras, oportunidade. Apoiem incondicionalmente estas mães, que optaram por esta valiosa veste, a concretizar o melhor possível a vontade de Deus. Não as perturbem com falsas esperanças, principalmente aquelas que por obra das circunstâncias têm uma família incompleta nos moldes da nossa cultura, ou seja, não têm um pai por perto.

Que a força de Deus seja encontrada por todas as mães.

Paz e Amor para todos nós!

 

Joana Pereira

 

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23.2.15

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Quando era pequena, sabia que tinha que crescer e ir trabalhar para ganhar dinheiro.

Fui lendo e percebendo que o ideal seria ganhar dinheiro com aquilo que se gosta de fazer.

Então, chegaram as questões que traçaram todas as opções tomadas:

O que quero ser o resto da minha vida?

Tenho que continuar os estudos ou posso ir já trabalhar?

Quanto dinheiro será preciso para investir num curso?

Será que o dinheiro investido compensará?

O que eu gosto dará um bom sustento?

Finalmente, assumi uma identidade e uma forma de estar na vida que traçou todo o percurso e escolhi a minha profissão e a forma ideal para que eu a possa desempenhar.

Agora que estou completamente embrenhada no que faço, não o trocaria, mas penso constantemente no que posso fazer para ganhar mais para a minha qualidade de vida ser melhor.

Ou seja, a profissão em si deixou de ser o centro da questão e passou a ser o dinheiro que ganho com ela.

Quer dizer, analisando friamente as questões anteriores, o dinheiro sempre pesou nas decisões quanto à profissão…

Parece-me cada vez mais utópico pensar em profissão como vocação… Mas lá vou conseguindo… Com muito suor, dedicação, esforço financeiro, físico e emocional.

Trabalhando com os mais novos, já deixei de perguntar tantas vezes “O que queres ser quando cresceres?”. Ou se pergunto, não associo a uma profissão, mas sim ao que se gostaria de fazer, que área do conhecimento e prática gostam mais. Depois das respostas, pode ser que seja possível arranjar forma desses interesses e gostos pessoais passarem a ser uma profissão em vista para o futuro.

Conheço inúmeras pessoas que não vivem na utopia, como eu. Preferem assumir a profissão apenas como um trabalho que se tem que fazer e, na maior parte das vezes, vivem frustrados porque chegam ao final do dia e sentem que nada fizeram para que esse dia valesse.

Porquê? Porque aquilo para o qual realmente teriam vocação, aquilo que para si mais faria sentido, não é posto em prática, em detrimento de uma função que tem que ser para pagar as contas.

Mas será assim tão grave? Se calhar não…

A realização que sentimos quando desempenhamos diariamente o que gostamos é facilmente substituída por frustração quando aparecem concorrentes, quando o nosso trabalho não é valorizado, quando as nossas forças vão abaixo.

Um dia de cada vez, sempre crendo que o que fazemos, fazemos bem e com as melhores das intenções para os nossos e para nós.

Chegar ao fim da vida e pensar que tudo fizemos para conseguir levar dela o melhor e deixar aos outros um bom exemplo.

O peso da profissão é grande, pois mais de metade da nossa vida é passada a desempenhá-la. Se isso não for vivido em pleno, para quê viver?

 

Sónia Abrantes

 

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20.2.15

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O pai despede-se da menina com um beijo. É aprumado e elegante, a gabardina e a pasta dão-lhe um ar executivo, bem posicionado na vida. É um homem com muita energia e dinamismo, este que sai de casa para o emprego. Regressará umas horas mais tarde, bastantes, na visão de criança, e voltará a dar um beijo à menina. Vem cansado, sem o aprumo nem a energia com que saiu e o beijo não é caloroso. A menina, que é muito observadora, ao vê-lo com os ombros caídos contesta por todos os dias dar um pai ao trabalho e o trabalho devolver-lhe aquilo.

E a profissão não nos rouba só a energia, como no caso retratado, rouba-nos também a identidade. Sobrepõe-se ao nome dos indivíduos que passam a ser conhecidos pelo Sr. Engenheiro, a Sr.ª Enfermeira, o eletricista, o canalizador – exemplificar é muito redutor uma vez que a identidade do individuo é engolida em todas as profissões.

Apesar deste efeito devastador, tão bem retratado pelo Quino e protagonizado pela Mafaldinha, todas as pessoas têm uma profissão, ou deveriam ter, porque ter uma profissão é estar capacitado para desempenhar um papel no desenvolvimento da sociedade. Desde pequenos que somos preparados para termos uma profissão. Observam-nos as tendências e talentos e emitem um parecer – tens jeito para isso – e ditam-nos o destino - tens que pôr em prática esse teu jeito. Auscultam-nos a vontade – o que queres ser quando fores grande?

Ter profissão é muito mais ou muito menos, como queiramos, do que fazer alguma coisa ou ter uma ocupação. Diz-se daqueles que não têm emprego, que a profissão é, “desempregado”.

Mas a profissão também nos dá coisas, por exemplo, estatuto. Pelo menos assim pensava o Sr. José. Quando tinha que preencher algum documento, no campo da profissão escrevia com orgulho, marido da Sr.ª Professora.

 

Cidália Carvalho

 

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18.2.15

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O trabalho ideal é aquele que nos faz erguer manhã bem cedo, de rompante, ao primeiro toque do despertador.

É aquele que não nos faz sentir culpados por passarmos tantas horas longe da família. Que nos enamora ao ponto de pensarmos nele mesmo quando não estamos a trabalhar.

É aquele que nos faz sorrir quando alcançamos uma meta. E que, quando a alcançamos, nos impulsiona a definir uma nova.

O trabalho ideal provoca adrenalina, nervoso miudinho, stress e tensão em doses moderadas.

É aquele que nos permite fazer aquilo de que gostamos e para que estamos habilitados, mas também nos proporciona tarefas e desafios diferentes fora da nossa zona de conforto, aportando novas experiências e conhecimento acrescido.

O trabalho ideal não nos provoca um sentimento de injustiça quando olhamos para o recibo do salário no final do mês!

O trabalho ideal proporciona prazer, realização e nunca cansa, mesmo nos dias mais cansativos. Transmite-nos segurança sem nunca nos deixar acomodar.

 

E depois… depois, há a Joana, que como estava desempregada há quase 18 meses e queria meter o mais velho na música, enquanto o mais novo precisava urgentemente de acompanhamento médico por suspeitas de autismo, aceitou trabalhar numa empresa sem qualquer vínculo contratual. Nesse trabalho, o carro (dela) acumula km, consome combustível e o retorno - magro e sempre atrasado – só chega se houver concretização de negócio.

Há ainda o Frederico, webdesigner de profissão, que na empresa onde está desenvolve alguns projetos ligados a essa área (e tem tanto potencial!), mas também é chamado para trocar lâmpadas ou consertar o autoclismo da casa de banho quando é preciso – muitas vezes.

E a Isabel, que apesar de excelente vendedora e vitrinista, foi convidada a cessar contrato quando regressou da licença de maternidade, já que a empresa a tinha substituído por um estagiário muito mais em conta. As vendas da loja caíram a pique, por isso Isabel foi chamada… para fazer férias, baixas e épocas altas – nunca sabe quando a vão chamar novamente ou se irão renovar o contrato temporário.

Ou o Jorge, professor não colocado, que encontrou no callcenter de uma grande marca a única saída profissional disponível para poder concretizar o projeto de arrendar um T1+1 e juntar os trapinhos com a namorada. Vive na pressão constante de obter resultados, importuna centenas de clientes e de muitos deles engole “nãos” ásperos com o mesmo discurso ensaiado que aprendeu no primeiro dia.

 

Mas todos eles, todos nós podemos sonhar com o trabalho ideal.

Enquanto sonhamos, a realidade torna-se um pouco menos insuportável.

 

Sandrapep

 

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16.2.15

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20 horas. O horário da visita terminou e percebo no olhar do meu familiar uma suspensão da satisfação pela minha companhia. O meu familiar está a dizer-me que não quer ficar “sozinho”. A noite já tinha caído e, de noite, dentro do hospital, entre quatro paredes brancas, tudo se torna mais intenso… o medo, a ansiedade… as horas não passam. Debilitado, limitado na sua autonomia, fragilizado do ponto de vista mental e físico, o meu familiar sente que precisa de um acompanhamento que lhe permita sentir-se menos mal com os seus problemas.

A única coisa que me ocorre dizer-lhe é que o(a) enfermeiro(a) ESTÁ LÁ. São profissionais presentes 24 horas diárias e que, quando estamos deitados numa cama com os problemas que o meu familiar apresenta, são eles que nos ajudam. Ajudam tendo por base uma formação técnica, científica e humana que lhes permite fazê-lo muito bem. Sei que se regem por princípios éticos e científicos muito sólidos que permitem ao meu familiar sentir um cuidado personalizado, humanizado e sistemático. Este cuidado requer uma relação em que o enfermeiro sabe que o seu objetivo é obter um resultado positivo para o meu familiar. Ele consegue.

Foi isso que eu transmiti ao meu familiar ao despedir-me do seu olhar triste. O (A) enfermeiro(a) ESTÁ LÁ!

A todos os(as) enfermeiros(as),

Muito obrigada por cuidarem de todos nós!

 

Ermelinda Macedo

 

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13.2.15

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Vários cenários se afiguram acessíveis a refletir em torno de um tema que para muitos constituiu um dos maiores problemas sociais. Como parte do continente negro que durante séculos, devido ao jugo colonial e ao “atraso” que o remeteu à cauda no ranking de desenvolvimento, seria tentado a enveredar por uma abordagem eminentemente rácica, porém trivial. Entretanto, uma abordagem mais objetiva e profícua do termo mostra-se mais ajustada ao meu exercício lexical.

O racismo é um tipo de preconceito, uma ideia preconcebida e pejorativa a respeito de uma etnia, raça, ou um povo em particular (www.significados.com.br). De facto não me enganei a respeito das diferenças entre as pessoas, faltava um conetor, esta ligação lógica, tal compreensão morfológica que despe a seco a falta de consenso patente nas disputas concetuais, algumas vezes associada à falta de extensão e inelasticidade das nossas posições às dos outros e até a discriminação que enfrentamos nas cadeias de relacionamento.

O’Sullivan, Sheffrin & Nishijima (2004:74) defendem de forma lacónica que o termo elasticidade mede a sensibilidade de resposta da quantidade demandada à mudança sobre as variáveis que a determinam. A relação casual entre a procura e a oferta percecionada através do respetivo preço determina a respetiva elasticidade. Entretanto, a reação dos consumidores a mudanças de preços varia de um para outro bem, em face de sua disponibilidade; os consumidores podem recorrer, em resposta a esses estímulos, a bens substitutos.

Quando se tem uma ideia preconcebida sobre determinada pessoa, as ideias por ela apresentadas e defendidas são tacitamente rejeitadas, são nocivas, não são consumíveis. A perceção que se forma à partida bloqueia qualquer interesse consciente ou inconsciente de capturar e digerir de forma seca e objetiva as suas ideias. A fraqueza humana é semita, muralha que esconde as nossas fragilidades, limitação em compreender o nosso semelhante.

Evidentemente que esse exercício inconsciente é parte da nossa luta e das nossas convicções, afinal, as pessoas são feitas de valores adquiridos e consolidados ao longo da sua vivência. A transposição cultural é um ato de autossuperação na medida em que incorre sobre nossas próprias crenças implicando algumas vezes a destruição criadora e consequente aceitação de novas ideias sempre que acrescentem valor a longo prazo.

Comportamentos racistas incitam a convicção de superioridade de determinada raça com base em diferentes motivações, assente na busca da perfeição, de um modelo único, na busca de uma posição de poder e vantagem relativamente ao outro, que redunda sempre num ciclo de frustração progressiva. Saber lidar com o stress compreende a tolerância, atitude de aceitação, cedência, abdicar ou adiar interesses imediatos para posterior, comprando paz com os outros. A indulgência é sabedoria, uma competência distinta no campo da gestão de conflitos que permite a rápida integração e aceitação nos diferentes ciclos e fóruns.

Assim, como superar e encontrar uma solução win-win ao diferendo que possa existir nas relações humanas? Através do diálogo contínuo centrado na razão, guiado pela lógica, evitando-se clivagens maiores que possam interromper o diálogo, sem se frustrar. É partilhando ideias que crescemos e aprendemos, uma total abertura ao mundo da descoberta sem contemplação, o que exige aceitar a nossa fraqueza como condição para aprendizagem contínua e para o renascimento.

A isenção humana é outro sinal de superação dessa dificuldade presente, naturalmente, na maior parte das pessoas. Em ciências sociais a qualidade de ser isento, também, pressupõe muito além da aplicação da velha ou mágica fórmula pois é pouco provável que determinado procedimento ou área de intervenção rejeite ou seja imperial relativamente a outros campos do conhecimento científico e mesmo sagaz.

Um mundo sem preconceitos pode revelar-se uma utopia na medida em que as diferenças são a base da existência e diversidade humana, o desafio diante dessa realidade é o sinuoso caminho da unificação que remete ao perdão primeiro a nós próprios e depois aos outros.

 

Antonio Sendi

 

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11.2.15

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   Foto: Sérgio Aires

 

Vivemos num mundo pluricultural e colorido e não temos como evitá-lo, ao contrário devemos saber acolher a diferença. Não considero que tenhamos que ser todos iguais, gosto da diferença, porque é através da diferença que se aprende, que se enriquece cívica e culturalmente. Gosto da diferença, sobretudo, porque um ser diferente de mim pode sempre ensinar-me a ver o mundo através da sua cor.

Cresci num sítio que adorava, até que na minha adolescência, surgiu o primeiro acampamento de ciganos, e depois outro, e outro. Depois veio o tráfico de droga, e os toxicodependentes a correrem rua abaixo desesperados, em busca de um pó miraculoso. E vieram as rusgas da polícia, os tiros, as rixas, o pânico na cara dos adultos. Foi uma época marcante que determinou parte de quem hoje sou.

Nesse contexto, como é evidente, não dava para gostar muito de ciganos. Até ao dia em que seguia de carro com o meu Pai, e parámos a falar com um amigo nosso da bola, um senhor com quem costumávamos assistir aos jogos de futebol do meu Salgueiral, tinha eu uns sete, oito anos. Percebi, abismada que esse senhor, tal como alguns outros que estavam sempre lá, naquela bancada atrás da baliza, era cigano. Nunca tal me tinha passado pela cabeça, não sabia sequer que havia uma diferença… nem tinha que haver, para mim aquele senhor, amigo de infância do meu Pai, era simplesmente isso: um amigo do meu Pai, e dos bons, porque todo ele efervescia de alma salgueirista. Dos bons, porque era um homem honrado que vivia do seu trabalho como feirante, e era um homem de família.

O mundo nos últimos anos tem comprovado que o que é preocupante não é a cor da pele, mas sim a verdade que se esconde debaixo dela. Debaixo da pele reside o caráter ou a ausência dele, o equilíbrio e o extremismo, debaixo da pela não existem máscaras, e isso sim, dá que pensar e muito que temer.

(Assim de repente, faz lembrar aquela deixa majestosa do Donald Sutherland “eu confio nas pessoas, só não confio é no diabo dentro delas…”)

 

Ana Martins

 

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9.2.15

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O racismo é um ismo que não percebo. Não compreendo como pode haver pessoas que odeiam e desprezam outras só por causa da cor da sua pele ou por causa das feições diferentes. Nunca consegui perceber e por vezes tento pôr-me no lugar de quem é racista para tentar perceber o que poderá eventualmente sentir, o que motiva o ódio, o que o leva a sentir desprezo pelo outro de cor diferente, de raça diferente. E não consigo sequer vislumbrar uma pontinha de nada!

Eu acho que acima de tudo o racismo é medo. Medo do outro, medo do desconhecido, medo daquele que é diferente e o medo leva-nos a fazer coisas impensáveis. Atacamos para nos defendermos. Vociferamos para não falarmos. Chutamos para não tocarmos. Isto porque não sabemos mais! E nunca tentamos explicar aquela raiva profunda, porque não queremos ver que no fundo temos medo. Tudo é medo.

Se pudéssemos olhar sem receio, veríamos que o outro é igual a nós, tem sentimentos, tem sonhos e desejos, tem manias e tem atributos, tem até um corpo igual. Sobretudo, veríamos que, no fundo, tem medo como nós, tem medo de nós, tem medo do nosso medo.   

 

Patrícia Leitão

 

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6.2.15

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Confesso logo à partida a minha dificuldade em escrever sobre racismo, por mil razões diferentes. Em primeiro lugar porque, grosso modo, confunde-se racismo com outras questões, que embora associadas, no fundamental não traduzem a pureza do termo. Em segundo lugar, meramente circunstancial, escrevo este texto dias após o atentado ao Charlie Hebdo e às mais recentes notícias divulgadas acerca das ações de Boko Haram, na Nigéria. Em terceiro lugar, poupando-vos às restantes 997 razões, porque detesto o politicamente correto e se existe um tema em que tal está intimamente imbuído, é mesmo este.

Durante algum tempo percorri mentalmente diversos caminhos que poderia trilhar para a escrita deste artigo. A tentação pela abordagem pessoal é sempre forte nestes casos e terá sido a primeira paixão a surgir. Contudo, rapidamente a abandonei. Se paixão implica fogo, ela implica também uma duração limitada no tempo. Um artigo incendiário, toldado pela temporalidade dos acontecimentos (vide parágrafo anterior), seria com certeza mais uma pedrada no charco lamacento em que se tornou alguma opinião publica por estes dias. Os “especialistas” que o façam.

A salvação apresentou-se então em forma de visita ao café. O dito possui talvez 20 m2 de interior, associados a uma esplanada / corredor de passagem do prédio em que se encontra. É principalmente frequentado por moradores dos prédios vizinhos, pessoas de variados tamanhos, cores, orientações e tudo o mais. Não interessa muito. São pessoas. Empregados, desempregados, reformados e situações dúbias de que ninguém tem dúvida. Alguns entram às 8, outros às 20. O que quer dizer que alguns saem do café às 19, outros chegam às 18. Não interessa muito. São pessoas.

Na esplanada de um café estavam três brancos e um preto. O branco que chegou mais tarde demorou algum tempo a inteirar-se do que se falava. Apaixonadamente, diga-se. Um dos brancos falava alto e gesticulava para a sua companhia do momento, um outro branco e um preto. A história que contava era acerca de uma viagem do dia anterior a Lisboa. Presumia-se imediatamente que tal viagem não lhe era habitual. Entre peripécias acessórias, contava o branco no palco, que tinha ido com um amigo a uma discoteca no Terreiro do Paço. Vinha maravilhado... “Ó mano! Não estás a ver as pretas que lá estavam! Até bati mal! Se as gajas daqui fossem lá abaixo, até se metiam num buraco!”

E mais ou menos nestes termos cavalheirescos continuou a deambular entre a memória e a fantasia da dita noite. Conseguiu ainda entabular pelas semelhanças (na sua ótica), entre um segurança preto e um gorila, muito principalmente, diga-se, pelo tamanho e não pela cor. E nesse preciso momento, com toda a franqueza exclamou para o preto que estava presente: “ainda era maior que tu!”.

E assim foi que muito animadamente continuou a conversa, até a mesma derivar para outro assunto que, confesso, este branco já não se lembra. Também, em verdade, muito dificilmente algo ocuparia o meu registo mnésico após o que tinha escutado anteriormente. Isso ou como diria um amigo meu, cabrito de tom mas preto convicto “Não percebeste? És mesmo branco!”.

 

Rui Duarte

 

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4.2.15

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Temo que daqui a cem anos ainda grassem entre nós as questões da rejeição, da diferenciação e da discriminação. São transversais e universais, pelo menos enquanto existir ganância e medo. Sim, porque o racismo, a xenofobia, a homofobia e fobias afins, assentam apenas e só nestes dois pilares: a ganância volta-nos para a atração do que é nosso e o medo para o afastamento do que não é.

Não se nasce nem com a cor errada nem tampouco no lugar errado. Quando muito fica-se rodeado pelas pessoas erradas, aquelas para quem a ganância e o medo tolhem a vista.

Ser-se racista é afirmar à boca-cheia que se teme o desconhecido. E antes que o desconhecido faça qualquer coisa - que há de ser necessariamente perigoso ou estúpido - há que se estar devidamente preparado para encaixar esse perigo ou estupidez num qualquer preconceito.

O pior é que andamos há séculos nisto, talvez desde o nascimento do capitalismo e da propriedade privada. Ou até antes disso. Volta e meia a história encontra formas de agudizar os medos, ora porque se escravizam negros, ora porque se matam brancos, ora porque os chineses, ora porque os muçulmanos… Mas no fundo há sempre (e sempre haverá) gente com medo, muita gente com medo.

Há medos compreensíveis, aliás, o medo é-nos para nos proteger, no entanto, não de cenas parvas. O desconhecido no caso do racismo não se aplica, é um mundo moderno e cosmopolita. A cor também não, porque é cor. Quando muito a cultura, mas nem essa vale porque a cultura só por si não é nenhuma ameaça, é apenas uma determinada forma de estar.

O racista faz-se do escuteiro foleiro que há em certas pessoas, naquelas que querem estar sempre preparadas para tudo. Como se, em face do desconhecido, lhes surgisse no ecrã a mensagem “Error #404 - file not found ”. O racismo enquadra-se num sistema de crenças, no mesmo sistema de crenças que leva a massacres e a genocídios. A base é toda a mesma: por ganância e medo é-se capaz das maiores atrocidades.

Há uma respeitável relação entre plasticidade de pensamento e tolerância, entre flexibilidade e integração das diferenças. Assim, e porque estas são caraterísticas internas ao Homem (pelo menos enquanto vivermos em comunidade), é bem provável que daqui a cem anos ainda estejamos como hoje, neste ponto de evolução. A não ser que consigamos conduzir este mundo para lugares onde a diferença passe a fazer parte da definição de existência.

 

Joel Cunha

 

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2.2.15

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Não é fácil para mim escrever sobre um assunto que é tão caro quanto inexistente. Mas o desafio está aí mesmo: será descabido e propositado existir o racismo até a minha liberdade terminar, porque na liberdade dos outros ele existe. E é rancoro.

Nunca entendi isso de avaliar o QI, qualidade de caráter, ou até pureza humanista, quando se depara com a cor da pele de uma pessoa. Faz algum sentido?

Convenhamos, não é isto o maior (ou mais um enorme) disparate que o Homem se lembrou de inventar? A sério que se eu for negra ou amarela (tantas vezes o sou) serei intelectualmente superior à minha colega de trabalho que é branca e loira? Posso rir-me ou é demasiado ofensivo?

É. É demasiado ofensivo. Porque existe e porque continuará ao longo da História da Humanidade.

Sou muito atenta à liberdade dos outros. Defendo veemente a liberdade que não é minha. Defendo-a como se o fosse, independentemente de amanhã estar sozinha ou não a defender a minha. O Mundo é de todos e nós não somos mais que formigas.

Hoje, num dia de profunda desilusão com o que me rodeia e com os filhos do meu Deus (ou com o Mundo, ou com a Vida… Ou até comigo), questiono-me até quando deixaremos de atacar os outros de uma forma gratuita, vil, disparatada.

É a ladainha cultural, colonial, provinciana. É o espírito da fraqueza disfarçada de superioridade e o resumo da estupidez humana num insulto ou discriminação.

Hoje não tenho palavras: hoje a minha página é um mundo em branco de incredulidade e de sentimento de desdém.

Não é fácil para mim escrever sobre um assunto que não existe no meu coração. Não é fácil para mim defender o óbvio, abrir as mentes para o discernimento do que deveria ser tão claro, transparente. Não irei defender com argumentos batidos, discutidos, levantados, aclamados. Não virei com clichês. Não defenderei o anormal nem lutarei por mentes patetas.

Tão e somente:

Tire o seu racismo do caminho, que eu quero passar com a minha cor.”; Georges Najjar Jr

 

Sofia Cruz

 

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