Num copo que repousa sobre a mesa, vêem-se algumas pedras de gelo. Um ambiente em que o ar rarefeito é partilhado por várias personagens reais. Estas são distintas na sua aparência e em comum apenas o cansaço após um dia de trabalho.
“- É hoje! Tenho a certeza que vai ser hoje que a minha maré de azar vai terminar!”, pensa um indivíduo de olhos encovados que bate nervosamente com os dedos em cima da mesa, demonstrado total impaciência no revelar do naipe de uma nova carta.
“- Eu sou o melhor! Caramba, como sou bom! Ganhei já três vezes seguidas! Na próxima tenho de apostar tudo e vou voltar aos bons velhos tempos… Ah, dinheiro na carteira!”. A excitação é visível naquele rosto demasiado pálido, sobre um corpo demasiado impaciente que mal consegue manter-se quieto.
“- Não! Eu não deveria estar aqui! Eu prometi! Eu dei a minha palavra de honra que não voltava… mas seguramente que me perdoa quando vir o pequenino PC que lhe vou comprar com o dinheiro que vou ganhar”. Um olhar vidrado mira estaticamente a roleta, aguardando e pedindo para a bola parar no número e na cor que ela tanto precisa, para obter o perdão por ter faltado ao prometido.
“- Quanto? Quanto mais poderei apostar desta vez? Vou arriscar e apostar a prestação da casa e, com um golpe de sorte, ganho e pago as duas mensalidades que já se em encontram em atraso. É isso! …”. Um pensamento que berra por uma boca cerrada.
Seja qual for o pensamento, a ilusão que se utiliza, ou o engodo, a verdade é que aquele que vive dependente vai sempre encontrar uma justificação e uma fantasia capaz de sustentar uma vontade que se torna irracional, apoderando-se de todos os sentidos, fazendo dele viciado.
Susana Cabral