CTV News
Naquele dia sairam de casa para irem trabalhar. Estavam num país onde se pode escrever sobre quase tudo e brincar com tudo. Há quem concorde com isso e há quem não concorde. Mas chama-se um dos preços a pagar pela democracia e eu, por acaso, gosto disso. Gosto de países em que se podem dizer e pensar dislates e barbaridades e podemos todos pensar sobre isso e até discutir sobre isso durante horas e discordar. E detestava nascer e viver num daqueles sítios onde as mulheres não podem votar nem vestirem-se como querem; ou num daqueles países onde ninguém pode ter opiniões a não ser o ditador lá do sítio; ou onde crianças de tenra idade são postas com uma arma maior do que elas nas mãos e aprendem a degolar quem é diferente em cor, religião, ou ideias. Ou onde pessoas são torturadas ou violadas para corrigir diferentes estilos de vida.
A Europa não é perfeita. Nenhum país no Planeta é perfeito. Mas há locais onde somos mais livres e mais felizes, e muita gente sai dos seus países para vir viver melhor para estes locais. E podem. E devem. E por mim, são bem-vindos.
Mas eu não quero que a Europa seja muçulmana. E quem ache que devia ser, em vez de vir para cá usufruir de uma vida melhor e depois, querer destuir a essência dos locais onde foram recebidos, bem que podia ficar na sua terra, não é? Se lá está tudo tão bem, saíram porquê?
Doze pessoas saíram de casa naquele dia para irem trabalhar e voltaram para as famílias em sacos, em pedaços. Estavam em Paris e pelos vistos, agora em Paris já se tem que ter cuidado com a liberdade de expressão. Porque há franceses que só são franceses porque os seus pais foram acolhidos mas, agora, têm filhos que acham que está tudo mal nos locais que os receberam. A mim parece-me mal, muito mal e muito grave. Novamente, podem sempre ir embora, para o fundamentalismo que tanto lhes agrada, não é? E muitos vão, só para voltarem armados e perigosos e vingativos.
Há mais casos, muitos mesmo, a virem-me à cabeça. Este é só o mais recente. Eu não tomo a parte pelo todo, mas também já tenho medo e já olho por cima do ombro. Já não me sinto descansada. Sinto-me inquieta, por mim e pelos meus amigos e familiares espalhados por países supostamente livres, onde foram recebidos imigrantes que, agora, dez, vinte, trinta anos depois, cospem na mão que os alimentou.
Não são todos, nem sequer a maior parte, mas nunca se sabe de onde vai surgir o próximo. E já não são só os africanos ou os asiáticos ou quaisquer outras minorias a ter medo, somos todos porque pelos vistos já não somos livres de viver pelas nossas próprias regras.
O Racismo nasce da falta de respeito por aqueles que são diferentes de nós. E do Medo dessa diferença.
Eu só queria paz e amor e respeito por todos. Já sei, é um clichê. Mas é também verdade.
Perceções sociais e diferenças biológicas hão de existir sempre. O que era excecional era vermos o fim das convicções de superioridade de uns em relação aos outros.
Podemos ser todos diferentes e aceitar isso, brindar a isso, aproveitar as mais-valias, as trocas de ideias. Podemos todos, apenas e só, aceitar-nos uns aos outros e, se formos ousados, aprender coisas novas.
Rematando assim à John Lennon, que era casado com a Yoko Ono:
“Imagine there's no countries
It isn't hard to do
Nothing to kill or die for
And no religion too
Imagine all the people
Living life in peace...
You may say I'm a dreamer
But I'm not the only one
I hope someday you will join us
And the world will be as one.”
Laura Palmer