Foto: Man Best Friend - Linnaea Mallette
Passaram-se semanas, não sei precisar quantas, desde que a vida como a conhecia ruiu. Perco a noção do tempo, tem-me acontecido amiúde. Fico simplesmente assim, como estou agora, sentado nesta cadeira durante horas, sem culpa nem angústia. Vivo um dia atrás do outro, neste pós algo que mudou a minha história, confuso e desorientado. Escondo-me no anonimato da minha condição de vida, fico até aliviado se se esquecerem que eu existo. Ainda não sei explicar como se sobrevive a acontecimentos catastróficos mas se sucumbe à dor da alma. Como é isso possível, perguntam-me alguns? Como pode um coração deixar de bater, como pode um cérebro entrar em colapso porque um homem já sofreu mais do que alguma vez achou ser possível? Um homem não chora, não deprime. Nem que perca os filhos na vida e perceba o que é ter o coração partido sem precisar de nenhuma arma.
Sinto-me um idiota por ter ousado acreditar que lutaria contra marés e sairia sempre vencedor. Por que raio não percebi isto mais cedo? Porque me sujeitei a todas estas ondulações, mesmo quando se tornou óbvio que seria esta a história da minha vida? Mudam as circunstâncias, avança o tempo no relógio, mas não deponho armas, não respiro. Não durmo tranquilo. Apesar da luta constante, não estou mais forte. Na verdade, nunca tive tanto medo como tenho agora. Não consigo correr nem sonhar. Não consigo fazer planos, concentrar-me em coisa nenhuma, nem nas coisas que sempre me deram muito prazer fazer. Não quero estar com ninguém; às vezes, não me entendo o suficiente para falar sobre mim próprio; outras vezes, sei que não querem realmente ouvir o que tenho para dizer. Tão pouco confesso que não consigo perdoar-me por não ter sabido poupar-me a tanto infortúnio. Sinto-me tão estúpido…
Ontem percebi que nada vai mudar na minha vida. Não consigo viver com o coração partido e já não me faz sentido caminhar em qualquer outra direção. Não quero recomeçar do zero, ou fingir que estou bem, pela enésima vez. Há coisas das quais não consigo recuperar, sinto-o claramente. Os meus remendos fazem de mim uma aberração, não quero isto como agasalho nos invernos ainda por vir.
Não escolhi viver mas escolho partir. Escolho antecipar aquilo que todos temos como certo mas que pensamos ludibriar, com sumos detox e fórmulas de rejuvenescimento, durante anos a fio. Não quero adiar coisa nenhuma. Não quero esperar pela morte num dia de velhice e cansaço e lembrar-me do dia de hoje. Sei que iria lamentar tudo o que me tivesse permitido viver até lá. Não preciso disso. Chega.
Escolho abandonar a margem e colocar a minha jangada no rio. Não quero voltar aqui. Aquilo que perdi, afinal, nunca foi meu. Mas era tudo que o que eu tinha.
Alexandra Vaz