Foto: Young Girl Smiling – Anna Langova
Segundo a Janela de Juari, a nossa personalidade divide-se em quatro partes:
- aquilo que nós e os outros sabemos de nós;
- aquilo que só os outros sabem de nós;
- aquilo que só nós sabemos de nós e
- aquilo que nem nós nem os outros conhecemos
Inevitavelmente, a vida, que é a mais sábia de todas as energias, correntes e filosofias, fez-me sentir na pele que não chega só saber aquilo que está à superfície, e que, de uma maneira ou de outra, os outros conseguem ver em mim. Desde então, aprofundar este conhecimento de mim, é um desafio que tenho encarado com respeito, porque nem sempre estou preparada para o que vou descobrindo. Tal como quando percebi, que ainda não tinha crescido… foi absolutamente desconcertante! Mas na realidade, eu, tão cheia de dor, de mágoa, de saudade, de força e de amor para dar, era apenas alguém que até essa altura, se tinha amado apenas através do amor dos outros, que nunca tinha nutrido a sua criança interior, e que tinha uma árdua tarefa pela frente, mudar o que não gostava em si, aceitar a sua essência e, acima de tudo, amar-se.
Durante anos, mais propriamente entre os 11 e os 36 anos, odiei visceralmente o meu segundo nome, com o qual sempre fui tratada, e assim que saí da minha “rede” geográfica, apresentei-me por Ana, “Só Ana”, repeti milhentas vezes, “o segundo nome não conta”. Porém, graças e esta necessidade de me conhecer que a vida me impôs, hoje percebo que odiava o meu segundo nome porque me remetia para o lado mais desfocado da minha existência, para o generation gap tão presente na minha adolescência, para todas as coisas que, até de forma inconsciente, não gostava em mim, portanto, se me chamassem Ana, talvez a aversão ao nome fosse a mesma…
É assim que a vida também revela a sua força maior, potenciando em nós uma súbita necessidade de fazer um reset. O arranque é demorado mas vale sempre a pena, se estivermos recetivos às atualizações. À parte a metáfora informática, na verdade este tem sido um dos maiores esforços que tenho feito: conviver comigo em amor, escavar bem lá fundo as pedras em que tropecei para que o caminho seja mais suave e sereno, sem receio das pedras que me esperam. Crescer não é propriamente fácil, pois não? Principalmente quando concluímos que afinal a crença não traduz a essência. A mim ainda me falta um longo caminho, mas é o que tenho aprendido que me faz seguir em frente, doa o que doer. E não me dou outra alternativa, mesmo assustada.
Eu? Eu sou sorriso, força, tristeza e nostalgia. Eu sou saudade, sou amor, sou mau feitio, sou cinismo, sou ciúme. Eu sou mimo, carinho e amizade fiel. Eu sou Filipe e sou João, eu sou Maria Rosa e Augusto, eu sou Lucinda, Conceição e Paulo, eu sou Cláudia e Ana Oliveira. Eu sou uma mesa cheia de amigos. Eu sou a casa barulhenta da Castanheira. Eu sou todas as pessoas que fazem parte da minha vida, as que me magoaram e deixaram, e as que partiram, apesar de me amarem. Eu sou sardas e corpo de mulher cheiinha. Eu sou Triana, sou Foz, sou todos os sítios que amo. Eu sou quem me ama. E preciso de todos estes “eus” para que possa ser simplesmente EU, a minha pessoa, um ser autónomo, independente de todos os outros, sem colagens ou dependências, um eu resiliente que dança conforme a vida toca.
Eu sou a Paula.
Assinado: Paula Bessa
Ana Martins