Foto: Smile – Nicolás Borie Williams
Rodrigo já recebeu diversas heranças, ao longo da vida. Herdou de várias pessoas: de vários tios e tias, dos seus pais, de uma irmã. Considera-se por isso um homem rico, já que valoriza muito o legado recebido, pela sua qualidade. Aquilo que é hoje, sabe-o, é o resultado do estar com eles e do que deles herdou, o ser e o estar, as atitudes e os comportamentos, uma boa parte da sua visão do mundo, a forma como se relaciona com o mundo e com as pessoas.
Heranças teve que não foram fáceis. Hoje percebe-as como heranças, como boas heranças, mas tempos houve em que a inquietação foi grande, por conflitos, por desentendimentos, por incompreensões. À época, tudo parecia confuso e incompreensível, mas afinal havia um sentido, um conteúdo impercetível que hoje, com a distância do tempo, se tornou claro e valioso.
Heranças, das outras, das tradicionalmente consideradas como tal, as desejadas e cobiçadas, as materiais, também as teve, embora poucas, mas essas revelaram-se um pesadelo, a fonte e o foco de experiências assaz desagradáveis, ao exporem o lado sombrio, ou negro, das pessoas.
Por isso Rodrigo, que é um homem de fé, em paz com morte que não deseja mas aceita, costuma dizer que a sua herança são os seus mortos e trá-los sempre consigo.
Fernando Couto