Há três semanas que aqui estou. Três longas e eternas semanas. Como era possível o tempo passar tão depressa lá fora, parecia que eu andava sempre a correr atrás do que me faltava ainda fazer, passava tudo tão rápido. Queixava-me tanto… queixava-me porque tinha de andar de transportes públicos, porque não tinha dinheiro para férias, porque a minha vida era uma rotina entediante, porque nada de especial me acontecia, porque nunca tinha tempo para nada, porque tinha demasiadas responsabilidades que me impediam de fazer o que me apetecesse.
E agora o tempo parou. De um momento para o outro, a minha vida parou. A rotina quotidiana que me parecia tão aborrecida mas tão certa deixou de acontecer abruptamente. Esta vida enfadonha que me fazia sentir encurralado no meio das minhas obrigações deixou de existir. Subitamente fiquei sem chão. Bastou receber um telefonema. A partir daí um atropelamento de diagnósticos e más notícias levaram-me ao ponto onde estou agora, este interminável ponto. Há três semanas que tudo ficou em suspenso, há vinte e três dias que estou enfiado nesta cama. Para além das dores e das náuseas a minha vida deixou de acontecer. Nas poucos momentos em que consigo ver televisão fico em primeiro surpreendido como parece estar tudo normal lá fora. Como é que eles fazem para continuar a rir, a actuar e a cantar? Este sentimento dura apenas uma fracção de segundo, rapidamente tomo consciência da minha realidade. É claro que está tudo normal, o mundo não acabou só porque a minha vida se desmoronou. A vida continua lá fora, sem mim.
O quanto eu dava para poder sair à rua, apanhar sol, caminhar normalmente, correr atrás deste bendito metro. Fi-lo tantas sem lhe dar a devida importância. Era livre sem saber. Só sabia queixar-me, desejar aquilo que não tinha. O quanto eu dava para me levantar e sair por aquela porta fora, correr até onde o fôlego me deixasse. Mal tenho forças para me aguentar sentado. Recebo todo o apoio dos meus, visitas, telefonemas mas sinto-me tão longe deles, tão isolado. Apesar das muitas manifestações de carinho, ninguém pode aliviar este sentimento de opressão, ninguém me consegue libertar. Depois de estarem comigo, todos saem por aquela porta e eu fico aqui, preso, por quanto tempo ainda? A dois metros de distância, aquela porta abre-se e fecha-se tantas vezes durante o dia, mas nunca é para mim.
Estefânia Sousa
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