Aqueles 20 metros que distanciavam o 5º andar onde vivia e o chão que pisava todos os dias para levar as crianças à escola, separavam a minha ansiedade entre a vida e a morte. Começava a evitar ir à varanda, pois sempre que isso acontecia, pensamentos, que na verdade não desejava, assolavam-me e permitiam-me questionar se não seria mais fácil acabar com tudo ali mesmo. Parecia tão fácil, tão acessível, tão rápido! Aqueles 20 metros definiam a diferença entre estar vivo e não estar, entre sofrer e não sofrer, entre sentir e deixar de o fazer. As crises de ansiedade começavam a ser mais regulares, a falta de ar, a frustração de não conseguir atingir a paz de alma que desejava. A crise, as dificuldades económicas, pareciam motivos insuficientes para que tais pensamentos navegassem em mim, mas o cansaço fala muitas vezes mais forte e retira-nos o discernimento que se quer coerente em situações mais difíceis. Deixei de ir à varanda. E se o fazia, não me aproximava do muro que me permitia abeirar dos metros que me separavam do chão, e quando o fazia olhava para o sol, ou as estrelas, e permitia-me admirar a beleza que me rodeava. Quis viver. Escolhi viver. E atravessar esses 20 metros, de elevador ou usando as escadas, e continuar a levar os meus filhos todos os dias á escola… permiti-me continuar a vê-los crescer e ter a certeza de que aqueles sorrisos, o brilho do sol, ou a luz das estrelas me bastavam para ser feliz.
Sónia Pessoa