Foto: Alone On The Beach – Emiliano Spada
Há algum tempo que ando a tentar descobrir quem sou. Por favor não me entendam mal, pois eu sei como me chamo, onde nasci, quando nasci, quem são os meus pais, que sou a sua única filha, onde moro, etc.. Ando a tentar conhecer-me a mim mesma pois, de alguma forma, desconheço-me. Ou conheço, mas não gosto de quem sou. Por isso, tenho procurado formas de me questionar, de refletir e de experimentar coisas novas, novas atividades, novas pessoas, pessoas que descobri pensarem como eu, quando eu achava que ninguém pensava assim. As pessoas que conheço não me interessam, não me ensinam nada. Quero pessoas que sejam melhores do que eu, que me obriguem ao esforço de aprender, de me descobrir e de evoluir. É assim que quero estar, sempre assim, nesse esforço.
Não sei como relacionar-me com as outras pessoas. Não recebi isso de ninguém, não aprendi, nunca me ensinaram, não sei como isso se faz, não sei o que são laços nem afetos, nem sei para que servem. E, talvez, já nem queira saber. Por isso nem quero sair de casa, não quero ver pessoas. Tenho os meus animais, que precisam de mim, que nunca abandonarei.
Hoje falei com um senhor que me disse que eu viva em desequilíbrio. Eu achei que ele me chamou de desequilibrada e quase me zanguei, mas depois percebi que não. Ele disse que era muito bom eu querer conhecer pessoas melhores do que eu, era bom querer melhorar e crescer como pessoa – e nem todas as pessoas querem isso. Ele chamou a isso colocar a fasquia alta. Mas depois disse que isso não bastava, que qualquer ser humano necessita de relacionar-se com os outros, de ter laços, de ter afetos. Disse que qualquer pessoa necessita de ter relações com o que está fora de si, com as pessoas e com o mundo. As pessoas precisam de ganhar mundo. E que mesmo que não goste do que encontre, necessita desse encontro, sendo necessário saber viver com o que o envolve, de ser capaz de se aproximar e de se afastar conforme o caso e o momento, de saber criar a necessária proximidade ou distância, mas sem romper com as pessoas, sem perder os laços e os afetos. Se perder isso entregar-se-á nos braços frios da solidão. Disse que se a fasquia está alta, mas não há possibilidade de relação com o que está fora de mim, estou em desequilíbrio.
Confesso que não entendi bem esta ideia. Não entendo a necessidade imperiosa de me relacionar com o que está fora de mim. Os meus animais necessitam de mim e isso basta-me. O que posso eu obter mais, fora de mim, na relação com as outras pessoas? Não sei, nunca tive isso, não sei como se faz. Ele disse que não tenho competências sociais – admito que não. E será que conseguirei aprender? Ele disse que sim, se me esforçar para aprender, se me abrir ao exterior, se tiver ajuda. Mas eu não sei como fazer isso. Eu até acredito nele, mas não sei fazer.
E cada vez tenho menos vontade de sair de casa…
Fernando Couto